Foi este livro, 'Quando Nietzsche Chorou', o meu livro de 'mesinha de cabeceira', melhor dizendo, de leitura no ‘Metro’ durante a primeira quinzena do mês de Julho nas minhas habituais e rotineiras deslocações para o emprego. A sua leitura foi sendo retardada na justa medida em que aumentava o prazer na sua degustação. O tema era profundo e inabitual e aproveitei a oportunidade para o (re) visitar calmamente. Apanhei-o da estante da minha filha/genro, não foi pois compra deliberada minha, e veio-me cair nas mãos assim um pouco de paraquedas. Não sabia de todo o que me esperava. Vi na capa que era best-seller em 20 países, li os diversos comentários (todos elogiosos mas pouco específicos) espalhados nas capas e fiquei entusiasmado não só com o grande acolhimento que tivera em muitas latitudes como pelo agrado que provocara em tanta gente.
Comecei a lê-lo como se de um simples romance se tratasse, presumivelmente igual a muitos outros. À medida que caminhava, a cuidada fraseologia aplicada, as ideias grandiosas vertidas, a profundidade do pensamento atingida, os nomes sobejamente conhecidos envolvidos, foram-me pondo em estado de alerta e inflacionaram o meu interesse.
No primeiro terço da viagem estava rendido.
Parei e fui investigar os nomes mencionados para eventualmente redimensionar a abordagem, o que aconteceu.
Não sendo a Filosofia, por princípio, um tema que me interesse especialmente, é todavia um assunto que desde os tempos de estudante, logo aí, me despertou atenção e desde aí também a comecei a acompanhar, embora esparsamente, por ter então percecionado ser uma parte intrínseca e importante no equilíbrio da vida de qualquer ser humano. Penso até que a nenhum é indiferente independentemente do seu nível académico ou cultural. Variará no grau, mas ninguém terá grau zero.
Este livro serviu para avivar esse lado muitas vezes em 'freeze', como os informáticos de agora gostam de dizer, e foi efetivamente bem inebriante sentir o despertar e até fervilhar mental que a sua leitura provocou. Tenho, sempre tive, admiração por 'cérebros', pela sua dimensão intelectual extra normal, capaz de levar os outros a novos patamares do conhecimento, a zonas onde os 'normais' sozinhos não chegam, mas que apreciam conhecer. A componente cognitiva é insaciável. As sociedades precisam destas mentes iluminadas, das autênticas, como de pão para a boca, capazes de clarificar, postumamente por vezes (para utilizar um termo do livro), futuros inatingíveis por gente mais comum.
Brilhante!
Irvin D. Yalom (EUA), o escritor deste livro, um artífice da palavra e do pensamento, ele próprio um eminente intelectual, conduz-nos através de uma dramaturgia singular e num jogo de espelhos e contra espelhos no mundo dos filósofos e dos psicanalistas. Percorre com as teorias ‘póstumas’ (visionárias) de Friedrich Nietzsche, filósofo, e Joseph Breuer, fisiologista e psicanalista, os labirintos da mente, viajando pelos seus nano capilares até então de desconhecida existência. Habilmente recria um romance pondo a falar, lado a lado, dois importantes pensadores - alemão e austríaco, da segunda metade do século XIX e primeira do XX - Friedrich Nietzsche e Joseph Breuer (que em vida não se conheceram pessoalmente), confrontando e dirimindo entre eles as teses que defendiam das respetivas áreas.
Não é normal haver um livro com tantas expressões lapidares, daquelas que nos obrigam a parar para conferir e refletir. Exemplo, chave de viver: ‘primeiro, desejar aquilo que é necessário e, depois, amar aquilo que desejado’. E com imagens de estilo inovadoras. Simples exemplo: ‘mandíbulas devoradoras do tempo’ (apreciação de quem, já mais na velhice, olha para trás e sente que o tempo passou rápido).
… e tantas outras!
Respiguei esta meia-dúzias de frases atribuídas a Friedrich Nietzsche:
"O amor é o estado no qual os homens têm mais probabilidades de ver as coisas tal como elas não são."
"Há homens que já nascem póstumos."
"A diferença fundamental entre as duas religiões da decadência: o budismo não promete, mas assegura. O cristianismo promete tudo, mas não cumpre nada."
"Quando se coloca o centro de gravidade da vida não na vida mas no "além" - no nada -, tira-se da vida o seu centro de gravidade."
"As convicções são inimigas mais perigosas da verdade do que as mentiras."
"Sem música, a vida seria um erro."
"A moralidade é o instinto do rebanho no indivíduo."
"O idealista é incorrigível: se é expulso do seu céu, faz um ideal do seu inferno."
"Um político divide os seres humanos em duas classes: instrumentos e inimigos."
"Quanto mais me elevo, menor eu pareço aos olhos de quem não sabe voar."
"Se minhas loucuras tivessem explicações, não seriam loucuras."
"Aquilo que se faz por amor está sempre além do bem e do mal."
"Há sempre alguma loucura no amor. Mas há sempre um pouco de razão na loucura."
"Cada pessoa tem que escolher quanta verdade consegue suportar"
"Acautela-te quando lutares com monstros, para que não te tornes um."
"Da escola de guerra da vida: o que não me mata, torna-me mais forte."
Irvin D. Yalom |
Friedrich Nietzsche |
Joseph Breuer |
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