sexta-feira, 20 de janeiro de 2017

Literatura: a despensa que tudo abastece

Há meses que não encontrava cabimento mental capaz de acomodar alguma boa leitura, melhor dizendo, os livros em geral; leitura tão necessária, de resto, à torrente das fontes que irrigam a diversidade e compreensão da vida e do mundo.

A este propósito, há uns meses, ouvindo uma entrevista num Podcast [“Falar Criativo” - (falarcriativo.com)] o escritor Afonso Cruz a discorrer sobre a importância da leitura, comparou, ele, o escritor a um cozinheiro que, para o ser, deverá ter sempre à mão uma despensa bem recheada, de onde possa socorrer-se para aprimorar a sua criatividade culinária. Ou seja, ‘ler muito’, como fonte inspirador e motor propulsor da escrita. 
Achei a imagem da despensa divertida e não menos interessante, por me parecer traduzir bastante bem o conceito e a importância do hábito de ler.

Ultimamente o mundo ferve, quase em ebulição, e as notícias nacionais e internacionais têm sido de tal ordem absorventes que relegam fácil e displicentemente para segundo plano aquele outro critério: o da leitura da “literatura pura”.
Tentar acompanhar e perceber tudo o que está a passar-se por aí - mesmo filtrando o mais importante -, é tarefa hercúlea e que absorve tempo.
Perceber o que se vai passando na UE de Merkel, nos EUA de Trump (hoje empossado), no Brexit de Theresa May, na Rússia de Putin, na Turquia de Erdogan, na China de Xi Jinping, na Coreia do Norte de Kim Jong-un, no “Estado Islâmico”, na Síria, em Israel e no Médio Oriente, refugiados… e sei lá o que mais, requer ouvidos bem atentos e leituras online; na hora, tal é a velocidade dos acontecimentos que nos chegam em catadupa.
Internet, TVs, Rádios, Jornais, Podcasts, e conversas tête-à-tête, são os recursos mais à mão para atingir esse desiderato, mas não suficientes. 
Há sempre um gato escondido com o rabo também escondido.

E a literatura, onde fica?

Na Web está disponível esse mundo novo e inteiro, ao alcance de um clic, de acesso fácil (e grátis) a maior parte. Pouco a pouco vamos acedendo a conteúdos e ferramentas que nos dão outras perspectivas e facilidades, mas sempre longe do todo.
Destaco, para o que agora quero sinalizar, os AudioBooks, os eBooks e a ‘Fala’: praticamente os mesmos conteúdos servidos em plataformas diferente. Ao gosto ou necessidade do utente.

São incontáveis os AudioBooks e os eBooks publicados na Web mas, em língua portuguesa, substancialmente menos; o que reduz as minhas opções por não dominar na dimensão pretendida o significado das estrangeiras mais comuns. São, no entanto, os AudioBooks e os eBooks, uma solução amigável e usável.

A ‘Fala’.
Tem o iPhone/iPad (e creio que os outros smartphones/tablets também) uma funcionalidade ao dispor (basta ativar) que nos facultam facilidades bem interessantes; não perfeitas, é certo, mas o bastante para responder aos mínimos: a ´Fala´.

Para ‘ver para crer’ baixei um livro bem conhecido para experienciar a proposta: “Amor de Perdição”.
Em dois dias foi-se! E gostei.
Deu, perfeitamente, para “ler ou reler”, já não sei bem, o célebre romance de Camilo, e glosar os rígidos hábitos e costumes do século XIX, seguindo a bússola que guiou a pena de um mestre: Camilo.
O ponto mais negativo, porque muito diferente dos hábitos do da leitura em livro, deriva do facto da leitura corrida e declarada por outrem, acelerar a vontade do desfecho, não pausando para reflexões a propósito; e com menos vontade de tirar apontamentos. E isso é um pecha a apontar.

Porém, em consequência desta “leitura”, fui recordar a plêiades de escritores famosos desse século e que agora, por esta via, vou revisitar.
Espero vir a preencher assim a lacuna acima identificada.

[‘Fala’ - trata-se de um método aplicável a qualquer documento digitalizado, programável para a língua pretendida, para a velocidade da leitura desejada, altura do som, do género do leitor dizente e com sublinhado a acompanhar o texto. Basta então selecionar a quantidade de texto que se pretenda e libertar ‘Fala’. Pode-se ainda pausar, anotar, pesquisar, retomar, marcar a página, escolher o tipo, tamanho e cor da letra e das páginas...]

terça-feira, 10 de janeiro de 2017

Mário Soares, reconhecimento e tributo

Já lá vai o tempo em que raciocínios imberbes influenciavam a avaliação do desempenho e bondade dos atores políticos, nacionais e outros, distinguindo, então, uns tantos imerecidamente; utilizo agora para o efeito um crivo de malha bem estreita, malha que o tempo teceu e foi apertando e por onde poucos conseguem passar. Fosse, aliás, reversível o anzol que outrora os selecionou e de lá alguns repescaria.

Mário Soares é um dos raros elegíveis que conquistou esse direito, consolidado numa carreira política e cívica longas.

Muito se tem dito e escrito sobre ele, nomeadamente por estes dias após a sua morte: praticamente todos sublinham sua vida pública como exemplar, com (compreensível) exceções para os retornados e (incompreensível) para os saudosistas de um passado longínquo.

Junto-me ao coro daqueles que apreciam a sua dedicação à causa nacional e revejo-me em muito do que foi dito; não vou repeti-lo.
Quero deixar, porém, aqui relevadas três grandes áreas que beneficiaram da sua ação e que mais apreciei: qualidade da liberdade, dimensão da democracia e visão Europeia. Para todas contribuiu de forma vívida, pioneira e assertiva para serem o que são hoje.

Estas expressões proferidas por ele ganharam i) uma sonoridade, uma alegria e uma dimensão novas; ii) uma profundidade reverberante que chega até hoje e que perdurarão no aplauso, no sentir e no querer de muitos.
Saídas da sua boca, transmitiam uma convicção e uma força que se convertidas em decibéis tornar-se-iam audíveis em muitas partes do mundo e não só cá dentro.

A liberdade, a democracia e também a Europa que temos hoje foram moldadas por ele. Aprendi e apreendi a sua liberdade, a sua democracia e a sua Europa.
E porque com elas me sinto bem, deixo-lhe aqui o meu pequeno mas reconhecido tributo.

A história nacional e, creio, estrangeira também, recordá-lo-á e ser-lhe-á elogiosa.
Como disse Camões, “da lei da morte se libertou” por muitos anos para bem de todos nós.
(07DEZ1924 / 07JAN2017)