terça-feira, 22 de outubro de 2013

Impressões - "HISTÓRIA DO SÉCULO XX", Martin Gilbert

Martin Gilbert
Para quem não dispõe de muito tempo para percorrer com mais detalhe os labirintos da História do Século XX e pretende mais rapidamente apanhar o comboio dessa história, tem nestes pequenos oito livrinhos um compacto do que de essencial então se passou no mundo.
Falo de uma leitura, diria, obrigatória, de mesinha de cabeceira, que ajuda a posicionarmo-nos na nossa rota histórica e melhor enquadrar, compreender e relativizar os acontecimentos dos nossos dias.

Na definição de ‘história’ nos primeiros bancos da escola, brincando, dizia-se: a história “é uma sucessão de sucessos sucedidos que se sucedem sucessivamente sem cessar”.
Definição ligeira, com humor mas com um fundo verdadeiro.

Afinal na história humana nada acontece por acaso: os acontecimentos, como as contas de um rosário, estão presos um aos outros. A questão está em sermos capazes de os decifrar atempadamente e de os relacionar.

Martin Gilbert fá-lo como poucos e com uma crueza sadia. Não emite opinião e limita-se a relatar factos. As conclusões/ilações ficam para a consciência de cada um e digo que pesam e muito.

Aqui acrescento uma questão que me acompanha há já algum tempo: a isenção do historiador.
Sem adicionar os nomes de quem me estou a lembrar, duvidei sempre da capacidade ou vontade de isenção dos historiadores; alguns selecionam criteriosamente fatos de forma a orientar o leitor para as ideologias que perseguem. Achava que não era possível direta ou indiretamente um historiador manter-se na zona da imparcialidade. Até achava humano tal postura ou dificuldade. Porém, com MG, essa dúvida é muito mitigada e quase sempre ultrapassada.
Com efeito MG atravessa a História do Século XX vestido com um fato de amianto impermeável a preconceitos políticos, religiosos, de continente, de país, de lobies, de grupo ou outros, mostrando-nos os fatos TODOS, vistos de todos os lados; apenas os fatos, ‘tout court’. Quando assim é a leitura torna-se mais absorvente e agradável. A ausência dessa rede no historiador liberta o leitor e aproxima-o do que é dito aceitando como mais verdade.
Não direi que é cem por cento isento mas anda próximo disso.

Na contracapa de cada livrinho foram transpostas algumas opiniões publicadas nos principais jornais mundiais, nos jornais de referência – goste-se ou não -, (Financial Times, Sunday Times, Daily Telegraph...), opiniões que assino sem reserva.
É de facto um historiador e escritor prodigioso, com uma capacidade intelectual e de trabalho árduo muito acima do que se conhece.
É notável a sua capacidade em conseguir condensar seus vastos conhecimentos de forma ordenada, muito completa, inteligível (e muito acessível) nestes pocket books.

Embora sem grande detalhe, tudo o que condicionou a história do homem no planeta terra (e na Lua) nesse século, é aqui lembrado: sucessos e insucessos, avanços e recuos, dúvidas e incertezas, guerra e paz.

Foi um século riquíssimo em muitos domínios.
É comum dizer-se que no século vinte tudo aconteceu. Até parece que antes o homem andou a semear de charrua para agora colher de Space Shutle.

É perverso e até esquizofrénico assumir-se, mas o grande motor que acelerou as maiores mudanças derivou das duas guerras, nomeadamente da segunda.
Quantas invenções não tiveram aí origem!?

MG dedica-lhes, à primeira e à segunda, e bem, muito do seu tempo; com todo o cuidado para que a história resulte compreensível e o leitor fique com o puzzle próximo do exato. E a meu ver fica, de forma curta, mas fica.

Também eu me deixei sensibilizar, indignar, revoltar…, não só pelas causas que as motivaram mas sobretudo pelo sofrimento indescritivelmente atroz sofrido.

Os números e factos em si mesmos impressionam!, alguns até às lágrimas. Refiro-me em especial aos relatos feitos sobre os atos indescritíveis e desumanos com que as pessoas foram desprezadamente tratadas no decorrer das duas Grandes Guerras. Tanto na primeira e ainda mais na segunda os níveis de horrores infligidos atingiram o inimaginável.
A quantidade de mortes [na primeira 8,5 Milhões e na segunda 60 Milhões (?)] diz bem.do.que.aconteceu.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Anexo:Mortos_na_Segunda_Guerra_Mundial

Que poder de atração - fatal -,
que fascínio exerceu Hitler sobre uma boa parte da população alemã! que o apoiou e levou ao poder!?
Como foi possível Hitler (e Mussolini) ter chegado ao topo do poder!
Que magnetismo ofuscante transportavam com eles!?

Não vou aqui acrescentar mais pormenores sobre o tema: os livros fazem-no muito melhor. Deixo apenas algumas impressões, alertas e homenagens.

Homenagem aos militares e civis mortos.


Homenagem à Grã-Bretanha e aos Estados Unidos d’América, através dos seus principais responsáveis, Winston Churchill e Franklim Roosevelt. 
Franklim Roosevelt
Winston Churchill

O que fazer com personagens abomináveis do género de Hitler?
Qual o castigo adequado para este (s) monstro (s)?
Em resposta à minha própria dúvida direi que o Homem não foi nem é capaz de conceber um sanção proporcionada aos crimes praticados!
A mente humana não consegue dimensionar tal punição; ficaria sempre aquém de…

Numa visita recente ao Bunker de Hitler - em Berlim, perto do Portão de Brandeburgo, onde se refugiou nos últimos meses e onde acabou por suicidar-se -, por uma coincidência (?) a meu ver feliz, (o algoz perto das vítimas…), foi erigido um Monumento aos 6 Milhões (?) de Judeus - também conhecido por Memorial do Holocausto - mortos na 2ª Guerra.
Gostei particularmente do Monumento.
A sua sobriedade, austeridade, profundidade, dimensão, extensão, cor…, remete-nos de imediato para a tragédia deste povo.
Pisando o terreno onde está submerso o bunker, me questionei sobre a opção de nada ter sido feito de mais visível ao longo dos anos para recordar o bunker e o seu ocupante (está apenas delimitado o espaço). Repensando sobre as eventuais razões, satisfaz-me o argumento de que não se deveria perder mais tempo com o personagem. Terra por cima e pronto, não se perca mais tempo com…
A ideia de que ninguém mais o seguiu é reconfortante. Tudo o que ele representava morreu com ele; não teve seguidores; não houve devotos que lá regressassem.
Nem as ervas crescem …

Estes incontáveis morticínios das duas guerras, com números nunca até então atingidos, despertaram nas gentes e nos seus governantes a consciência do valor da vida humana e a necessidade da sua proteção.
A dor, a angústia, o sofrimento mexeu finalmente com a escala de valores estabilizadoras das sociedades e reescalonou sua orientação.
Foi possível a partir daí reunir na mesma mesa - ONU - muitos países e pensar nesse objetivo.
A banalização da morte foi travada.
Não mais ocorreram no mundo tais números, felizmente.
  
 
Memorial do Holocausto

sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Deficit da CGA: 4MM€/Ano

Na revista 'Visão' do passado dia 03 de Outubro, foi publicada uma crónica de Diogo Freitas do Amaral, sobre o Deficit da Caixa Geral de Aposentações.
Encostando-se ao livro 'O Meu Programa de Governo' de José Gomes Ferreira (setor privado), e usando do contraditório para proteger sua tese, discorreu em quatro pontos a sua abordagem ao tema. O artigo está bem escrito, escorreito como é de resto seu apanágio; usa e bem esta sua característica para dizer o que pretende e fá-lo bem.

Senti, para além da forma, um grande incómodo ao lê-lo e, à medida que me ia apercebendo da sua verdadeira intenção, senti também um enorme formigueiro e mal-estar a crescer dentro de mim.
Ao escrevê-lo, usou essas suas armas e mais uma: a do extenso testo para anestesiar o leitor.
Escondeu, aplanou, branqueou, maquiou - chame-se-lhe o que se quiser - argumentos a meu ver clarificadores da sua posição.

Usando eu próprio também o meu direito da defesa do meu ponto de vista, carrearei para o tema os pontos seguintes:
Não revelou quem foi o 'pai', o grande responsável pela reforma dos novos estatutos da CGA.
Poderia e deveria ter historiado que a CGA foi reinventada por Aníbal Cavaco Silva que em 1993 os aprovou e promulgou, era então Primeiro-ministro.
Poderia e deveria ter dito que a CGA daí resultante ficou mal estruturada, cheia de problemas e que só em 2012 lhe foram introduzidas as necessárias (?) correções de sustentabilidade; que esteve portanto 19 anos a sobreviver ligada à máquina do OGE, de todos nós.
Estamos pois perante um assunto que teve um grave e enorme pecado original e que o culpado tem nome;
Deveria ter dito e não disse e foi nisso intencional, que a CGA foi revista objetiva e fundamentalmente para continuar a servir uma certa classe da sociedade: os funcionários públicos;
Deveria ter dito e não disse que os pensionistas da CGA auferem pensões bastante superiores à dos privados;
Deveria ter dito e não disse que as reformas do setor público funcionam de forma diferente e bastante mais favoráveis que a dos privados da Segurança Social, não só nos montantes pagos, como atrás se disse, como nos critérios de acesso, nomeadamente nos da idade (ultimamente menos devido à conjuntura).

O seu escondido e secreto objetivo foi o de manter os funcionários públicos, incluindo as suas reformas, num patamar distinto na sociedade portuguesa, lembrando o cancro das 'castas' na Índia (que nem Mahatma Gandhi conseguiu erradicar): uns, os privados, são os Párias, e os outros, os funcionários públicos, os Bramas.
Este ponto é para mim da máxima importância e interpreto o seu artigo intelectualmente desonesto por esconder pensadamente argumentos para proteger-se, a si e aos seus.

Ainda bem que no final da crónica declarou os seus interesses: que foi e aufere pensão como funcionário público. Fica-lhe bem mas usa também esse último argumento para, mais uma vez, tentar disfarçar a sua pseudo-isenção de político e intelectual impoluto e inatacável. Esconder este ponto é grave, crucial e fatal.

'A mulher de César tem de ser séria e não só parecer séria'.
Um manto diáfano disfarça a virgem!

O manto protetor dos funcionários públicos é enorme e chega a todo o lado. Cerram fileiras quando se sentem ameaçados e, até agora, com sucesso: não perderam nenhum dos inúmeros 'direitos adquiridos'.

Em breve o Tribunal Constitucional pronunciar-se-á sobre os cortes de 10% nas reformas dos funcionários públicos propostos pelo Governo. É minha convicção que vai 'chumbar' mais está medida: protegem a classe e consequentemente a si próprios.

Franklin Roosevelt logo a seguir à depressão de 1929 teve de lutar tenazmente com idêntico Tribunal Constitucional que o obrigou a reinventar alternativas para o país então tão necessitado de soluções para ultrapassar a grave crise em que estava mergulhado.
Passos Coelho bem pode inventar soluções para tentar resolver o problema do país mas, desde que sejam medidas que belisquem este setor, estarão sempre condenadas ao fracasso.

Aliás percebe-se e ouve-se bem a música da orquestra que, bem afinada, chutará Passos como fez com Sócrates.
São indiferentes a qualquer solução que venha a ser implementada; o importante mesmo é que não lhes toquem nos direitos e estatuto adquiridos.

Já em tempos aqui o disse e bem-desejei a presença da Troika; não porque goste deles mas porque entendo que a sua presença força soluções de nivelamento social que de outra maneira seriam impossíveis de introduzir em Portugal.

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Cacofonia Nacional


Ao ler há poucos dias uma entrevista de José Félix Ribeiro - estudioso que acompanho há alguns anos - dei comigo a refletir sobre o interesse que teria para Portugal a existência de ‘Think Tank’s’.
Trabalhava ele ainda no ‘Departamento de Prospectiva e Planeamento’ e aí produziu e deu à estampa conhecimentos, fundamentados em cuidadosos estudos, que mereceram a atenção e interesse de muita gente, e meu também. Não estou aqui a validar esses estudos, estou apenas a afirmar que os achei muito interessantes e muito bem alicerçados, resultando em apports de novos conhecimentos sobre áreas que até então desconhecia, pelo menos com aquela extensão e profundidade. Trabalhava em primeira mão para o estado mas muitas das suas ideias não saíram do papel.

“Em casa onde não há pão, todos falam e ninguém tem razão”.
Um bom mote para apreciar a dissonância opinativa nacional.

Em Portugal assiste-se, a respeito de tudo e de nada, à difusão de um sem número de opiniões desgarradas de que, por tantas serem, poucas ecoam de fato, fazendo lembrar o efeito do delta do Nilo mas ao contrário. Por outro lado as pessoas, por saturação, simplesmente não lhes dispensam a atenção necessária.
Bem sei que estes ‘opinion makers’ recebem ‘à tarefa’; só que para a condução do país nos mais diversas zonas de interesses, não atingem o alvo, resultando em palavras soltas ao vento e não chegando a criar raízes ou correntes de opinião. Uns dos poucos que como D. Quixote isoladamente conseguiu mover os moinhos, e a quem foi dado algum crédito - já fora de tempo -, foi Medina Carreira, goste-se ou não dele.
Seria bem mais profícuo se os ‘pensadores’ se concentrassem em forums específicos, e daí resultassem correntes de opinião, fortes, que mostrassem as alternativas possíveis nos vários domínios da sociedade; com menos dispersão portanto, e focando as pessoas em temas mais concretos. E não só políticos. São aliás redutores ao confinar-se maioritariamente à política.
Conhece-se o CES, com pouca atividade e, com ressonância, pouco mais.

O Jornal Público estudou e publicou:
“97 Comentadores semanais nas TV’s a que correspondem 69 horas de comentário político semanal”, e salvo a exceção de José Sócrates, todos recebendo interessantes recompensas monetárias, algumas mesmo ‘muito interessantes’. Ex.: Marcelo 10.000 €/Mês; Manuela Ferreira Leite: 5.000; Marques Mendes: + de 7.000!
Ao ouvir-se tantas vozes e tão dissonantes, mais parece uma cacofonia, chegando mesmo à esquizofrenia. Está a perder-se um tempo precioso, que já não temos, para pensar em conjunto soluções de futuro viáveis.
A ampulheta não para!

“os Think Tank são organizações ou instituições que atuam no campo dos Grupos de interesse, produzindo e difundindo conhecimentos, assuntos estratégicos, com vistas a influenciar transformações sociais, políticas, econômicas ou científicas sobretudo em assuntos sobre os quais os pessoas comuns não encontram facilmente bases para analisar de forma objetiva”

quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Alemanha: 'Reparações de Guerra'

Tratado de Versalhes | 1919
1ª Guerra: 1918

Somente após os Aliados terem a certeza de que a Alemanha tinha efetivamente capitulado, aceitaram negociar a paz, impondo-lhe condições punitivas pesadas:

* Reconhecimento da culpa;
* Perda de parte do seu território, incluindo as colónias;
* Redução do tamanho do exército;
* Proibição de fábricas de materiais bélicos;
* Indemnização pelos prejuízos causados.

Foram todas arrancadas a ferros e ficaram plasmadas no extenso e pormenorizado 'Tratado de Versalhes' (1919), e aí, de entre o diverso articulado, ficou estipulado que a Alemanha aceitaria pagar indemnizações aos Aliados pelo esforço financeiro que haviam tido com a sua intervenção, o que ficou conhecido como 'Reparações de Guerra' (270 Milhões marcos-ouro ou 33 Milhões USD).

Esta dívida contumaz, que deveria ter começado a ser paga logo nos anos subsequentes, não o foi. E não o foi principalmente por três motivos, a saber:

1º - a Alemanha do pós-guerra entrara num processo recessivo, com desemprego e inflação a níveis tais, que o país não gerava riqueza capaz de honrar os compromissos, nomeadamente os externos;

2 - a assinatura do Tratado de Versalhes resultou de uma obrigação de circunstância formal inevitável e não de uma aceitação racional e muito menos nacional;

3º - os delegados alemães sabiam que esta assinatura poderia ser o fermento onde poderia levedar a próxima futura oposição interna.

§ haveria de ser aqui neste ambiente de choque, humilhação e revolta nacionais, com o orgulho alemão ferido, que Hilter viria a encontrar espaço para lançar as sementes do que viria a ser o 'partido nazista' e as causas que agregaram e empolgaram os seus seguidores para a 2ª guerra mundial, apenas 20 anos depois.

Embora pressionadas pelos 'credores', habilidosamente - todavia com argumentos visíveis (desemprego e inflação) -, conseguiram adiar, ano após ano, o pagamento das reparações acordadas; e os credores, com o passar do tempo não mais tiveram 'força' para lho exigir.

Haveria de ser com a assinatura do tratado da U.E, 70 Anos depois, que as partes zeraram a dívida.

Depois da 2ª Guerra, paulatina e estrategicamente, a Alemanha começou a montar no terreno os alicerces do que é hoje.

Começando na Comunidade Europeia do Cavão e do Aço (CECA), (1951), gizaram, a régua e esquadro, o organograma do sucesso.
Durou uns anos mas chegaram lá, novamente ao topo do mundo. Não precisaram mais de recorrer às armas mas à economia.

Terão sido os 'Credores', ironia do destino, (ou não!) quem, depois da segunda guerra mundial, lhes ofereceu o primeiro bônus!, quando para lá fizeram jorrar dinheiro através do Plano Marshall (1947) - (13 Bi USD / equivalente a 132 Bi em 2006).

Agradecidos pegaram nos tostões e com tempo produziram milhões.

(Resumo muito breve da edição reduzida de Martin Gilbert, 'HISTÓRIA DO SÉCULO XX')
U.E.
Plano Marshall | 1947
CECA | 1951