"Ter um filho, plantar
uma árvore, escrever um livro"!
Há muitos anos que tropeçava nesta expressão: 'ter um filho, plantar
uma árvore, escrever um livro'. Quando a ouvia de alguém passava-me pela mente
o exagero, o pretensiosismo, o despropósito seguidos de algum desdém e
desrespeito por quem a emitia, mesmo se convictamente. Definitivamente não a
levava a sério; até risível e desprezível conseguia pensar do que então ouvia.
O certo porém é que no acontecer normal da vida o filho, no caso a
filha, apareceu. Em boa hora, diga-se.
Mais tarde, também, fruto um pouco do acaso, a árvore, aliás várias, foi
plantada.
O livro, faltava o livro.
Decorreram alguns anos e a carga negativa da expressão foi diminuindo
de intensidade. Com o tempo, o 'risível' foi-se paulatinamente esbatendo e
passou para a zona mais adormecida do cérebro.
Entretanto a vida continuava seu curso.
Outrora fui um leitor não direi compulsivo mas bastante amigo dos
livros. Conservei sempre essa proximidade embora com distâncias irregulares. A
leitura, a par de outras, sempre foi uma enorme porta aberta para o mundo, para
novas descobertas e para o conhecimento, no seu sentido mais lato.
Fiz todavia um interregno da leitura mais assídua dos livros, para
acompanhar com mais detalhe outra porta de entrada de informação e novidades:
os jornais, a televisão e mais recentemente a internet. Na internet, a sua
fonte inesgotável de informação levou-me, (e continua a levar) à subscrição de
inúmeras Newsletter noticiosas oriundas de muitos quadrantes e dos vários
cantos do mundo. E aí sim, esse acesso fácil e instantâneo a todas as notícias,
traduziu-se efetivamente num salto gigantesco a tudo e em toda a parte do
globo.
Foi já em 2010 quando mudei da casa, que me desfiz de uma boa parte dos
livros que cuidadosamente conservava e isto pela simples razão de que não havia
espaço disponível para os acomodar convenientemente na nova residência. Doei-os
então a uma junta de freguesia das redondezas. Fiquei apenas com uma coleção de
reserva (talvez uns 200) que, por ser coleção e serem todos do mesmo tamanho e
com o formato de 'pocket book',
facilitou e muito a sua arrumação e conservação.
Já na nova residência e tendo de deslocar-me todos os dias para o
emprego, de Metro, em que despendia uma hora por dia (meia, mais meia), começou
o tédio a acumular e a distorcer o lado lúdico da viagem. Olhar todos os dias
as mesmas sonolentas e silenciosas pessoas ou escutar o som eletrónico, desumanizado,
metálico, impessoal, frio, ensurcedor e rotineiro da menina do Metro
('Matosinhos Sul'; 'Matosinhos Sul' - 'Sentido, direction, Senhor de
Matosinhos'), estava a destabilizar-me um pouco. O reservatório da tolerância
estava a encher aceleradamente.
Que fazer?
Como resolver a questão?
Sem muita convicção ou mesmo vontade fui à estante e apanhei 'Cartas de
Guerra' de António Lobo Antunes.
Além de me deparar com uma escrita fácil, o tema do livro era-me
familiar: a guerra colonial portuguesa.
A leitura do livro reacendeu em mim recordações vívidas dos dois anos
que por lá passei. Entusiasmado pelo fervilhar das recordações, alinhavei
algumas perspetivas e vivências pessoais sobre o tema e coloquei-as lá, no
próprio livro, e posteriormente neste Blog.
A seguir a este, outros livros foram aparecendo (recorrendo também aos
da minha filha/genro) e durante as leituras a vontade de me pronunciar sobre os
temas neles tratados ou sobre outros que eles me inspiravam, foi-se impondo
naturalmente.
E aí nasceu o gosto de escrevinhar.
Já tinha experimentado textos e temas livres que inopitamente me iam
surgindo ou a vida suscitava, mas as leituras de livros provocavam-me e
convocavam-me quase irresistivelmente.
O Blog foi a solução
encontrada, mais amigável, para a execução deste impulso.
Encontrar a fórmula, o formato e o estilo da escrita passou por um
processo de aprendizagem e experimentação que levou algum tempo a definir-se
até ao ponto em que comecei a sentir-me confortável e confiante com o
resultado.
O processo criativo e a arrumação das ideias não sendo fácil e muito
menos automático é todavia, para além de exigente, estimulante e até, por
vezes, inebriante. Requer inclusive algumas cautelas para a salvaguarda do
excessivo ou do deslumbramento torpe.
Não foi fácil ou pacífica a sua exposição na 'net'. Durante bastante
tempo não tive a coragem suficiente para isso. Foi necessário vencer algumas
enraizadas resistências interiores.
Passado algum tempo, anos, verifiquei não ser especialmente importante
a sua exposição ao grande público internetiano.
Estimulante, sim, começou a ser o prazer sentido na sua criação. Mais relevante
que o número de leitores, quem lê, ou o que pensarão sobre o que eventualmente
leiam, é ver expressas em forma de letra, o que este ou aquele tema me inspira
ou sobre outros me apraz pronunciar. O que cada um pensa pertence ao seu
direito individual e intocável e não me apoquenta mais. Assim como me sinto
livre para pensar e escrevinhar, assim todos os outros o sentirão (ou não)
também; mas isso pertence ao foro íntimo de cada um e a ninguém é dado o direito
de o retirar.
Passei com alguma facilidade para o comentário / opinião político e
social, com bastante naturalidade e apetência. Comecei também a incluir um ou
outro pedaço de vida pessoal não só em texto próprio como inserto noutras
crónicas, adicionando evidências pessoais como complementos à minha opinião ou ao tema em tratamento.
Estou numa fase de maior confiança em que transponho para aqui o que em
cada momento me ocorre e sobre o qual acho oportuno dizer algo. As barreiras
estão bastante mais reduzidas e salto-as com algum à-vontade.
Tem sido uma experiência bem interessante, com motivações e conclusões
inesperadas.
Funciona muitas vezes como catarse para temas que pontualmente ou
sempre me acompanharam mas que ao passá-los para aqui provocam um alívio
apaziguador. Até parece que, ao alijar essa 'carga', fico mais leve, mais em
paz comigo mesmo ou, porque não, como que me desfaço dela entregando-a a
alguém.
Obviamente que ao pensar-se num tema e por uma questão de lealdade e
honestidade tenta-se ser o mais verdadeiro possível. Não se devendo lealdade a
terceiros fica apenas a verticalidade pessoal em causa e aí, pode-se não se ser
verdadeiro - embora se tente (errare
humanum esd) -, mas o que se escreve é honesto e sincero.
Também é verdade que, não raras vezes, se escreve pensando na pessoa A
ou pessoa B, funcionando um pouco ao contrário de quando nos posicionamos como leitores
ao sentirmo-nos incluídos neste ou naquele parágrafo de um qualquer texto.
Por outro lado, ao longo da vida, o nosso depósito de conhecimentos,
experiências, vivências e emoções, tendem a enchê-lo até ao vazamento, e dá
vontade a certa altura que esta emulsão laboratorial veja a luz do dia. Quanto mais
não seja para memória futura.
Tenho notado que fico refém do que escrevinho, isto é, á medida que
aqueles temas evoluem ou vão sendo repassados no tempo, vão sendo sempre
testados e validados no dia-a-dia; se continuam a fazer sentido. Logo, o mais
seguro é estar-se bastante certo com o que se escreve.
Obviamente que o discurso oral alicerça-se muito no que já foi ali pensado e escrito, sendo que o contrário também é verdadeiro. Quantas vezes uma conversa solta, um pensamento, uma frase aparecidos do nada, vão servir de mote para o tema que mais tarde se desenvolverá.
Obviamente que o discurso oral alicerça-se muito no que já foi ali pensado e escrito, sendo que o contrário também é verdadeiro. Quantas vezes uma conversa solta, um pensamento, uma frase aparecidos do nada, vão servir de mote para o tema que mais tarde se desenvolverá.
Obviamente, também, não reescrevinho nada. O que foi escrito, assim
fica.
Irei continuar a escrevinhar assim me acompanhe o gosto, alguma
inspiração, algum engenho e alguma arte.
Voltando ao início deste apontamento, dou por ultrapassadas as dúvidas e demais questões referidas e, digo mais, aconselho vivamente a qualquer um a simples tentativa ainda que em regime experimental. Estou certo que concluirão o mesmo que eu: vale bem a pena.
Voltando ao início deste apontamento, dou por ultrapassadas as dúvidas e demais questões referidas e, digo mais, aconselho vivamente a qualquer um a simples tentativa ainda que em regime experimental. Estou certo que concluirão o mesmo que eu: vale bem a pena.
Sem comentários:
Enviar um comentário